O avesso do imaginário
Hélio Oiticica com Bólide Lata 1, Apropriação 2, Consumitivo, 1966 (Claudio Oiticica/Reprodução)
Sabemos – ainda que confusamente – que a arte fala de nós, que ela carrega algo importante sobre o homem e o mundo, mesmo que isso não se deixe capturar em palavras, em uma teoria – ou talvez graças ao fato de que isso resiste a uma teoria, justamente.
Podemos dizer que a arte fala d’Isso, brincando com o Es (o Id, em certas traduções), região “mais extensa, mais grandiosa e mais obscura que o ‘eu’”, como diz Freud em A questão da análise leiga. Há algo, fundamental em nós mesmos, que se encontra fora de nós – o mais íntimo é êxtimo, para usar o neologismo forjado por Jacques Lacan em seu Seminário 7 – A ética da psicanálise. A arte é o campo da cultura em que isso se apresenta, trata-se portanto de um campo necessário à teorização psicanalítica. Freud foi buscar na tragédia de Sófocles o complexo de Édipo e, de forma coerente, ao longo de sua obra segue sempre afirmando a primazia do artista sobre o psicanalista no conhecimento do inconsciente.
Se por vezes a menção a obras de Shakespeare, Michelangelo e outros parece servir de sublime confirmação de uma teoria já estabelecida, o motor subterrâneo da aproximação freudiana da arte e da literatura provém, portanto, de uma posição muito mais relevante a respeito da produção de conhecimento. A psicanálise não é uma visão unificada e definitiva do homem. A teoria, assim como a prática do analista, apesar de ter bases sólidas, não se constitui como um saber garantido, mas está sempre por se reinventar, no contato com a clínica e com o mundo.
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