Meu corpo e eu
Sigmund Freud e sua filha, Anna. (Foto: domínio público)
Talvez surpreenda que alguém que pratica a psicanálise fale do corpo quando a prática analítica coloca o corpo em suspensão. Há nela um noli tangere que o uso do divã leva a seu ponto mais alto. Deixar de lado o corpo no dispositivo analítico não se deve a nenhum tabu de contato, mas sim a um cálculo para dar lugar privilegiado à palavra. A suspensão de qualquer tipo de manipulação dos corpos a favor da palavra pode levar a pensar que para praticar a psicanálise é necessário prescindir por completo do corpo, podendo, por exemplo, analisar por Skype ou chat. Em algumas ocasiões pode ser necessário lançar mão desses recursos tecnológicos, mas é sempre bom reservá-los para casos de força maior. Freud preconizava a suspensão do corpo a ponto de fazer dela uma regra da prática analítica: a regra da abstinência. Para além de qualquer caricatura, isso torna patente que quem fala não está ali: não sou eu quem falo, Outro fala por minha boca, sou falado a partir de outro lugar, a partir de outra cena. Em meus sonhos, equívocos ou atos falhos digo o que não quero dizer, confesso o que não reconheço desejar nem pensar. Quando se põe de lado o corpo é pelas melhores razões, para que o inconsciente tome a palavra e se faça presente em meus ditos. Quando o analista responde ao inconsciente do analisando com uma interpretação, seja ela com palavras ou silêncios, também exclui a pessoa do analista, alguém que, como um oráculo, é somente o mensageiro de uma mensagem que, no fundo, vem do próprio paciente. O emissor recebe do recepto
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