Menos em mais um dia
(Foto: Amy Welting/Unsplash)
Lugar de fala é o espaço dos leitores no site da Cult. Todo mês, artigos enviados por eles são publicados de acordo com um tema. O de agosto de 2020 é “solidão”.
Um homem dopado de quarentena e com cólicas de abstinência do trabalho. Delirava.
Tocar a própria campainha e entrar dizendo para si mesmo: seja bem-vindo!
Bater na porta do banheiro e perguntar: vai demorar?
Aguardar o invisível se calar enquanto lava o rosto perdido no azar do inquebrável espelho.
Abrir a luz do abajur e deixar os insetos invadirem o quarto e dançarem desgovernados as canções das noites.
Tatear as paredes fingindo que é sonâmbulo e procurar o interruptor dos olhos.
Ao apagar do abrir: imagine que um vulto te vê e tente não se assustar, já que ainda é habitável de lembranças de infância.
Sirva dois pratos. Apenas um cheio. Observe o prato vazio e agradeça a companhia por ter comido tudo. Deixe a torneira pingando em 140-bpm e se irrite com a ausência de quem a deixou aberta.
Se quiser acordar: durma. Não esqueça de alimentar o relógio com grãos de rotina e hábitos de alcalina recarregável. Durma: se quiser acordar.
Delírios para te salvar dos lúcidos. A luz apagou a própria janela do andar nº algum e as estrelas, as estrelas, as estrelas…
Costa Melo é escritor, fotógrafo e músico em Ponte Nova, MG