Poema temporário
(Foto: Aaron Burden via Unsplash)
Lugar de Fala é o espaço dos leitores no site da Cult. Todo mês, artigos enviados pelos leitores são publicados de acordo com um tema. O de janeiro de 2020 é “liberdade de expressão”.
Por José Antonio Francisco
Por que silenciar minha pena? Instrumento que acalma corações e liberta almas. As ideias não estão nas minhas letras, nas minhas palavras gravadas em pigmentos ou rochas, ou, nos tempos modernos, em dados digitais… As ideias estão cravadas em nós mesmos, em nosso existir… Pelo escrever organizamos e compartilhamos. Compartilhamos para que outros possam desenvolver suas próprias ideias, suas próprias perspectivas, a partir de um conjunto de experiências e configurações de sentido que foram atribuindo a um conjunto comunicativo comum.
O escrever é um ato tão libertador porque nos liberta da solidão das ideias. Em 400 ou 600 anos avante, gerações desconhecidas podem buscar decifrar os intricados sentidos desses nossos textos, no caminho por compreender como vivemos, desejamos e construímos nossos mundos. Ou mesmo agora, pessoas de diferentes realidades, podem exercitar o olhar ao outro, o olhar ao lado, o carinho amigo.
E não fora esse movimento que movera o mundo concreto? O movimento das ideais? Existiria modernidade sem Humanismo ou Iluminismo?
E ainda mais: o que escrevi não me vincula ao que escreverei porque, justamente um está no passado o outro no futuro. É um reflexo, justamente, da dinâmica pungente do concreto-eu pensante/borbulhante.
O hoje é a única certeza do homem? Como poderia ser, se o “agora” acabou de passar e o devir é constante?
Uma vida plena está na multiplicidade de palavras, no compartilhar de possibilidades, de novos horizontes, novas trilhas que se abrem justamente pela busca incansável…
Recolher-se desse campo de vida, para viver no falso silêncio de si mesmo, é perder oportunidade magnífica de usar o tinteiro que cá se encontra nas mais variadas experiências que temos.
