A ironia política de Rimbaud
Rimbaud publicou suas obras mais famosas quando ainda era adolescente (Foto: Reprodução/Henri Fantin-Latour)
Publicado no jornal Le Progrès des Ardennes, em 25 de novembro de 1870, sob o pseudônimo de Jean Baudry, o texto “Le rêve de Bismarck” foi descoberto em 2008. A tradução é de Lucas Bertolo e Sílvio Rosa Filho.
O SONHO DE BISMARCK
FANTASIA
É noite. Em sua tenda, repleta de silêncio e de sonho, Bismarck, um dedo sobre o mapa da França, medita; de seu imenso cachimbo escapa um filete azul.
Bismarck medita. Seu pequeno e adunco indicador caminha sobre o papel velino, do Reno ao Mosela, do Mosela ao Sena; com a unha, raspou imperceptivelmente o papel em torno de Estrasburgo: vai além.
Em Saarbrücken, em Wissenburgo, em Wörth, em Sedan, retrocede o pequeno indicador adunco: acaricia Nancy, arranha Bitche e Falsburgo, raspa Metz, traça sobre as fronteiras pequeninas linhas esfaceladas, – e para…
Triunfante, Bismarck cobriu com seu indicador a Alsácia e a Lorena! – Oh, sob seu crânio amarelo, que delírios de avaro! Que deliciosas nuvens de fumaça espalha o seu cachimbo bem-aventurado!…
*
Bismarck medita. Veja! Um grande ponto negro parece deter o indicador esquivo. É Paris.
Então a pequenina unha ruim, de raspar, raspar, raspar o papel, aqui e ali, com raiva, – enfim, de parar… O dedo permanece ali, meio dobrado, imóvel.
Paris! Paris! – Depois o velho, de tanto sonhar de olhos abertos, suavemente, foi tomado pela sonolência: sua testa se reclina rumo ao papel; maquinalmente, o fornilho de seu cachimbo, escapando a seus lábios, se abate sobre o imundo ponto negro…
Ih, povero! Ao abandonar sua pobre cabeça, seu nariz, o nariz do Sr. Otto Bismarck mergulhou no fornilho ardente… Ih, povero! Va povero! No fornilho incandescente do cachimbo… Ih, povero! Seu indicador estava sobre Paris!… O sonho glorioso acabou!
*
Era tão fino, tão espirituoso, tão feliz, esse nariz de velho primeiro diplomata! – Escondam, escondam esse nariz!…
Pois bem, meu caro, quando, para partilhar o chucrute real, você entrar pelo palácio [palavras ilegíveis] com gritos de… Nossa Senhora! [palavras ilegíveis] Na história, você levará eternamente consigo esse nariz carbonizado entre os seus olhos estúpidos!…
Olha aí! Não devia cochilar!