Dossiê | Cultura e Gastronomia
Este dossiê quer situar o leitor diante da alimentação vista de uma nova perspectiva analítica que se desenvolve nos últimos quarenta anos, frisando os vários aspectos da qualidade do que se come. Até então, o principal problema alimentar considerado dizia respeito às carências proteicas e à fome propriamente dita. Organismos multilaterais como a FAO preparavam relatos anuais sobre "o estado da fome no mundo" ou, em linguagem técnica moderna, o "estado de segurança alimentar e nutricional". Era crucial, nesse traçado, conhecer o nível de consumo de proteínas animais, o que deixava as civilizações milenares da Ásia muitas vezes em situação crítica em relação aos países centrais do capitalismo.
Historiadores como Warren Belasco (O que iremos comer amanhã?, Senac, 2009) que especularam sobre o "futuro da alimentação" não deixaram de apontar o caráter ideológico da dieta que se tornou medida do estado nutricional do mundo, onde a centralidade da carne é a expressão material de um modo de vida que exclui as civilizações hindu e chinesa, baseadas na agricultura irrigada do arroz. Comer carne, no século 19, tornou-se símbolo de "civilização", como atestam as conquistas do far west americano e dos pampas argentinos e, hoje, no século 21, pressiona as fronteiras amazônicas.
O próprio Malthus, no seu pessimismo, não deixava de ver o colonialismo como expediente de exportação dos excessos populacionais que permitiam a expansão dos pastos para produção de carne. Certamente essa era uma questão crucial em termos malthusian
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