O coração selvagem da vida

O coração selvagem da vida
(Foto: Wellcome Collection)
  Certa vez, Helio Pellegrino, célebre nome da psicanálise brasileira, disse à Maria Rita Kehl em início de carreira que, não importa onde estiver, “o psicanalista escuta o desejo debruçado sobre o coração selvagem da vida”. Sabemos que esse coração pulsa nos consultórios, clínicas, ambulatórios, mas também nas escolas, centros socioeducativos, universidades, instituições da política pública, do direito, enfim, no trabalho de muitos. Enlaçada a outros dois elos da arte humana, a saber, a educação e a política, a psicanálise compõe a tríade que Freud, inspirado em Kant, estabelece como artes ou ofícios impossíveis. Curar, educar e governar seriam essas “artes dificílimas”, cujo poder exercido sobre o outro se dá sem mediação, portanto, sem garantias de êxito, justamente por se alimentar do que é imprevisto, singular e irredutível. Quem as exerce deve contar sempre com uma cota expressiva de fracasso aos olhos arbitrários da norma, pois sabe que atua onde o “coração selvagem” ameaça a própria sociedade de se desfazer. Não há como desconhecer que, desde sua invenção, a psicanálise se acha enodada à educação e à política. O próprio Freud dedicou inúmeros escritos para teorizar algo da política de sua época por meio de questões à constituição das instituições modernas, à moral vitoriana repressora, ao fascismo, ao antissemitismo, às guerras e à própria destrutividade humana da pólis. São escritos de seu tempo, mas, sempre revisitados, reverberam no nosso de modo bastante perturbador. Por sua vez,

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