“A política tem se tornado uma commodity”

“A política tem se tornado uma commodity”

Jaqueline Gutierres

A um ano das eleições nos EUA, uma das primeiras perguntas do jornalista Silio Boccanera ao escritor paquistanês Tariq Ali foi se o governo presidencial de Barak Obama estava sendo uma decepção para ele. “Não, porque eu não esperava nada dele”, respondeu Ali, durante o painel “Paquistão-Afeganistão – equívocos na guerra ao terror – Obama imita Bush”, na VII Fliporto. Ali ainda complementou: “George W. Bush era considerado um demônio e Obama tem sido elogiado por ele. Bush disse que Obama é um grande presidente e que tem feito o mesmo que fez durante seu governo”.

Ali foi fiel ao tema da palestra quanto às críticas à gestão de Obama, porém não limitou sua acidez aos EUA. Entre os destaques de sua fala, a Primavera Árabe e a crise do mercado financeiro. Primeiro criticou a postura dos cidadãos ocidentais quanto aos problemas do Oriente Médio, ”desde o atentado de 11 de setembro, a imagem consolidade no ocidente é de homens barbudos matando pessoas”. O escritor ainda destacou o perigo desse posicionamento, “quando desumanizam os islâmicos, não se importam com quantas  pessoas morrem”. Ali citou a foto do ex-ditador líbio, Muammar Gaddafi, como um desses exemplos. “Eu nunca gostei de Gaddafi, mas o modo como foi mostrada a imagem no ocidente está muito errado.”

Ainda sobre a Primavera Árabe, Ali comentou que os levantes surpreenderam a todos, inclusive aos árabes. “Na Tunísia, o ditador caiu em muito pouco tempo, em seguida, aconteceu o mesmo no Egito, isso deu esperança. As pessoas perceberam que se unindo poderiam vencer. Agora, onde isso vai acabar não se sabe.” O escritor afirmou que os protestos contra o mundo financeiro, que vêm se popularizando, como o Occupy Wall Street, foram claramente inspirados no movimento egípcio.

A revolta nos EUA é apenas simbólica, segundo o escritor. “São no máximo 700 pessoas, que ocupam espaços públicos mostrando indignação, assim como na Inglaterra. Já na Espanha é algo realmente grande.” Ali afirmou que a população está começando a achar a democracia inútil, e que esta é a causa dos conflitos. “Os problemas acontecem ao redor do centro financeiro que, sem ideia sobre como sair das crises, usa dinheiro público para tentar resolvê-las. Mas não vão conseguir”. Para Ali, as crises só terão solução quando a população deixar de eleger banqueiros para o governo. “A política tem se tornado uma commodity”.

Ali deu destaque aos problemas norte-americanos, afirmando que o país compensa sua fraqueza econômica com o poderio militar, mas que esta “é uma carga pesada demais para um país em dificuldades”. Segundo o escritor, alguns republicanos já questionam o alto gasto com as guerras, “coisas imprevisíveis podem acontecer se essas ideias se fortalecerem. Mesmo assim, não se pode subestimar o poder desse império de derrubar uma resistência interna”.

Boccanera questionou se, com essas crises, o capitalismo estaria chegando ao fim. “Não. Gostaria de dizer que sim, mas o capitalismo não vai cair enquanto não houver uma alternativa a ele. No momento atual, a única que parece viável, funciona dentro dele, com maior controle do sistema, o Estado social-democrata.”

Depois do encontro, Tariq Ali se dirigiu à Feira do Livro, que integra o evento, para sessão de autógrafos. Destaque para o recém-lançado A noite das borboletas douradas (Record).

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