A memória castigada

A memória castigada
por Alcir Pécora As Coisas da Vida (Alfaguara) reúne 60 crônicas do escritor português António Lobo Antunes(1942-). Produzidas originariamente para o jornal Público e para a revista Visão, de Portugal, os textos estão divididos em sete conjuntos que penso, entretanto, que se poderiam dispor, de modo mais econômico e informativo, em quatro: invocação de infância, manias e fatos do escritor, histórias da desflor de adultos e lembranças de África, onde, como é sabido, Lobo Antunes serviu como médico do Exército português no período das guerras de libertação de Angola. Da infância, o autor retém, por exemplo, as grandezas e surras do pai; a juventude da mãe, grávida ano a ano; os muitos irmãos; as namoradas dos 10 anos; a figura protetora do avô; as beatices e os trocados ganhos da avó; as esquisitices dos adultos, de cujo mundo incompreensível e triste passou a fazer parte sem perceber. Da vida de escritor, relata em particular os incômodos dos prêmios, feiras de livros e dos leitores confiados e autoritários, bem como as angústias de terminar um livro começado há muito. No que chamei de histórias da desflor estão pequenos contos de velhos casamentos, cuja rotina irritadiça corrói os dias, ou de fins de casos, quando por vezes, contra todas as evidências, um dos parceiros ainda espera o milagre de reacender a antiga chama. Nas lembranças de África, o principal está em capturar a irrupção da beleza, e mesmo da felicidade possível, em meio aos horrores da guerra. De modo geral, Lobo Antunes esfria a matéria quente das lembran

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