A construção do gosto
Walter Langley, O órfão, 1889/Coleção particular
Um amigo tem o hábito peculiar de encenar um pequeno jogo culinário quando recebe convidados em sua casa. O jogo acontece sobretudo se é a primeira vez que esses convidados o visitam, e torna-se mais curioso se o anfitrião, com fama de bom cozinheiro, desconhece ou desconfia do gosto que os comensais possuem em matéria de mesa – se mais provinciano ou mais aventureiro.
Sem dar-lhes a conhecer os ingredientes, serve, como primeiro prato, uma sopa de bananas. A sopa consiste de um caldo de frango em que se cozinham bananas bem maduras até que se desmanchem. Acrescenta-se curry, sal, pimenta do reino e serve-se como um velouté, finalizado com salsinha. Antes da louça, chega à mesa um aroma doce e penetrante. Os convidados, além do aroma, vislumbram a cor amarelo intensa e o anfitrião pede, a título de brincadeira, que os convidados adivinhem os ingredientes. A surpresa que se segue provoca um resultado previsível e nem por isso menos divertido a cada vez que se repete: “Mas não imaginava provar uma sopa salgada de bananas!”.
O jogo se encerra apenas ao final da noite, quando o casal de anfitriões avalia os pratos que voltaram à pia. Aqueles limpos indicam convidados com paladar aventureiro e aberto, os apenas remexidos apontam neofóbicos polidos, que provaram duas colheradas para agradar aos anfitriões e os pratos intocados expressam os limites sinceros dos convidados que por uma questão de princípio, ou de gosto, recusam-se a misturar sabores doces e salgados (e ainda curry, um tempero pouco utilizado no perfil de sabor da cozinha brasileira) – a
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