Notícias de outras ilhas: Fabrício Corsaletti
O escritor e pota Fabrício Corsaletti (Foto: Companhia das Letras/Divulgação)
Fabrício Corsaletti nasceu em Santo Anastácio, no oeste paulista, em 1978, e desde 1997 vive em São Paulo. É autor dos poemas de Movediço (Labortexto, 2001), O sobrevivente (Hedra, 2003) e História das demolições e Estudos para o seu corpo (2007). Escreveu também os contos de King Kong e cervejas (Companhia das Letras, 2008), a novela Golpe de ar (Editora 34, 2009), os poemas de Esquimó (Companhia das Letras, 2010, prêmio Bravo!) e Quadras paulistanas (Companhia das Letras, 2013), entre outros.
Para a seção “Notícias de outras ilhas” – em que poetas, escritores e tradutores sugerem leituras para o período da quarentena – indica poemas de Li Bai, Rumi e Roberto Bolaño. A seção é curada por Tarso de Melo. Leia os poemas e o comentário da poeta abaixo.
Traduzi o poema de Li Bai a partir de duas traduções, uma argentina e outra brasileira. O de Rumi, a partir de uma edição inglesa. O de Bolaño, a partir do original em castelhano. Nos dois primeiros casos trabalhei com grande liberdade; ao Bolaño, pela proximidade entre as línguas e culturas, tentei ser fiel. Encher a cara sozinho, fazer amor e/ou ter insônia, reler os poetas que mudaram a nossa vida: essa é a única receita que conheço pra encarar a quarentena. Não é suficiente, claro. O medo de perder as pessoas que amamos e a revolta diante de um governo psicopata contaminam e estragam tudo.
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Bebendo sozinho sob a lua
Li Bai
Bebo sozinho, rodeado de flores,
diante da jarra de vinho.
Levanto o copo e convido a lua.
Com minha sombra, somos três.
Mesmo que a lua não possa beber
e minha sombra me acompanhe em vão,
eu as considero minhas companheiras.
Vamos aproveitar a primavera antes que acabe!
Canto, e a lua passeia.
Danço, e minha sombra vacila.
Ainda estou sóbrio: que a festa continue!
Agora estou bêbado: hora de nos separarmos.
Ó lua, ó sombra, amigas imortais,
logo estaremos juntos de novo
no mundo cristalino das estrelas!
***
Rumi
com você passo a noite acordado
sem você não consigo dormir
glória a Deus por essas duas insônias
e pelas diferenças entre elas
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Leia os velhos poetas
Roberto Bolaño
Leia os velhos poetas, meu filho
e não se arrependerá
Entre as teias de aranha e as madeiras podres
de barcos encalhados no Purgatório
lá estão eles
cantando!
ridículos e heroicos!
Os velhos poetas
Palpitantes em suas oferendas
Nômades abertos ao meio e oferecidos
ao Nada
(mas eles não vivem no Nada
e sim nos Sonhos)
Leia os velhos poetas
e guarde seus livros
É um dos poucos conselhos
que seu pai pode lhe dar