Privado: Ruídos e silêncios
por Manuel da Costa Pinto
Quando Claudio Abbado substituiu Herbert von Karajan à frente da Filarmônica de Berlim, em 1989, a sucessão significou muito mais do que a simples troca de regentes na melhor formação orquestral do mundo, ou uma natural alternância de gerações musicais – o romântico dando lugar ao vanguardista, numa tardia reverberação daquilo que acontecera, décadas antes, no campo da composição.
Mesmo para quem ouve a música de invenção dentro de seus próprios parâmetros, como linguagem que tende ao absoluto, a ascensão de Abbado teve um sentido simbólico: saía de cena o protótipo do maestro tirânico, de olhar glacial, responsável por nada menos do que três gravações integrais das nove sinfonias de Beethoven; subia ao pódio o milanês aristocrático, mas politicamente de esquerda, que se comunicava com os músicos com gestos discretos e um sorriso de cumplicidade, incorporando peças de autores como Luciano Berio e Alfred Schnittke ao repertório das orquestras pelas quais passou.
Numa orquestra “comum”, ainda que ilustre (Abbado também esteve à frente do Scala de Milão e da Sinfônica de Londres), a alternância corresponderia a uma diferença de estilo e a maior ou menor sensibilidade à produção contemporânea. Numa formação com a história política da Filarmônica de Berlim, a presença de Abbado iluminou e pôs termo final a um passado nebuloso.
O uso instrumental da orquestra alemã pelo regime nazista é bastante conhecida – e um livro recém-publicado no Brasil, A orquestra do Reich – A Filarmônica de Be
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