50 anos de “Persona”

50 anos de “Persona”

Cena de “Persona” (1966), de Ingmar Bergman (Reprodução)

Eric Campi

 Considerado pelo crítico norte-americano John Simon “o filme mais difícil de todos os tempos”, Persona, do cineasta sueco Ingmar Bergman, tem seus 50 anos de lançamento comemorados com a mostra “Por trás da máscara: 50 anos de Persona”, em cartaz a partir deste sábado (15), no Itaú Cultural. Para Helen Beltrame-Linné, diretora do Bergmancenter na Suécia, a exposição promove a chance de “explorar cada peça desse quebra-cabeça” que é Persona, classificado por ela como um grande representante do modernismo, ao lado de obras como Guernica, de Pablo Picasso e Ulysses, de James Joyce.

A mostra é composta por um acervo que nunca havia saído da Suécia, onde fica em exibição no Bergmancenter, em Fårö, ilha na qual o filme foi gravado. Serão exibidos cadernos de trabalho de Bergman, trechos do roteiro de Persona e o único registro colorido do filme que existe. A diretora do instituto, Beltrame-Linné, tem acesso a todo arquivo de Bergman e conta que a opção foi “explorar o próprio conteúdo do filme, suas diferentes facetas, proporcionando ao público diferentes pontos de entrada para tentar decifrá-lo”.

O drama lançado em 1966 mostra a história de Elisabeth Vogler, atriz que, após surtar em uma apresentação, fica muda. Apesar do enredo relativamente simples, Beltrame-Linné acredita que se trata da obra mais enigmática de Bergman pela sua “fluidez de tempo absoluta, em que realidade e sonho se misturam o tempo todo”. As leituras proporcionadas pela mostra – como um painel montado com todos os frames impressos do famoso prólogo do filme – permitem resgatar o poder de Persona, que “envelheceu sem nenhuma ruga”, na opinião da diretora.

Ela estará no Itaú Cultural, juntamente com o psicanalista Contardo Calligaris, a cineasta Tata Amaral e o jornalista Sérgio Rizzo, na próxima quinta (20) para uma roda de conversa, e nesse mesmo dia haverá exibição do filme. Em entrevista ao site da CULT, Beltrame-Linné adianta detalhes da exposição.

CULT – O início de Persona apresenta uma sobreposição de imagens heterogêneas em uma espécie de experimentalismo. Quais as influências das vanguardas modernistas e do surrealismo na obra?

Helen Beltrame-Linné – Persona é considerado um dos maiores exemplos do modernismo no cinema. Ele é comparado a obras-primas como Guernica do Picasso e Ulysses do James Joyce. Como o próprio Bergman declarou, este é um dos filmes nos quais eles chegou mais longe em termos de experimentação, e isso fica claro logo no início com a montagem do prólogo terminando em um pedaço de película queimando sob a lâmpada do projetor. Nesse sentido temos uma seção interessantíssima na exposição: os frames do prólogo, que são vistos muito instantaneamente durante o filme, foram impressos e combinados em um grande painel. Uma oportunidade única de explorar cada peça desse quebra-cabeça.

Por que o crítico americano John Simon,  afirmou que Persona “é o filme mais difícil de todos os tempos”?

Se ele é o filme mais difícil de todos os tempos não sei, mas pode-se dizer que é o filme mais enigmático de Ingmar Bergman. O enredo de Persona é simples, mas baseado em premissas que criam mistério de cara: uma personagem principal fica muda o filme inteiro. Então o espectador tem à sua disposição a leitura verbal de um só personagem o tempo todo, frente ao silêncio sepulcral da outra. Isso dá espaço para nossa imaginação fluir… O que está pensando a que não fala? Como ler sua expressão facial? A isso se combina o fato de Bergman ter desenvolvido o filme com uma fluidez de tempo absoluta, então realidade e sonho se misturam o tempo todo. Por fim, a experimentação visual adiciona um último tempero: o enredo é mesmo o que nos é apresentado pela narração? A fusão dos rostos das duas atrizes em dado momento explicita isso: estamos diante de duas personagens ou seria somente uma oscilando entre dois papeis?

Como foi o trabalho de curadoria? Como teve acesso às anotações dos cadernos de trabalho do diretor, o roteiro e os trechos de making of?

Nós do Bergmancenter temos acesso a todo o arquivo de Bergman, todos seus cadernos de trabalho, diferentes versões dos roteiros. A peculiaridade de Persona é ser um filme com pouquíssimos atores e cenário e figurino muito simples, então não se tratava de expor itens da produção. Optamos por um caminho de exploração do conteúdo do filme, suas diferentes facetas, proporcionando ao público diferentes pontos de entrada para tentar decifrá-lo. Persona é um dos filmes mais atuais de Bergman, um filme feito há 50 anos que envelheceu sem nenhuma ruga, e que poderia estar sendo lançado hoje nos cinemas. Então apostamos no poder do filme, tanto em forma quanto em conteúdo. E o processo de criação de Persona é um prato cheio por si só: de um lado temos Ingmar Bergman num momento crucial de sua vida, questionando seu próprio valor como artista, internado num hospital, paralisado como a protagonista. Suas anotações no caderno de trabalho sobre o filme são muito ricas, escrever esse filme foi uma verdadeira terapia para ele. Isso é algo que exploramos na exposição. Do outro lado da moeda temos a filmagem na ilha de Fårö, um momento de criação coletiva que Bergman amava, feita com muita liberdade durante um verão na ilha. Foi o primeiro trabalho dele com Liv Ullmann, dando início ao relacionamento dos dois, e naquele momento Bergman decide morar na ilha. Foi realmente um renascimento dele para a arte, renovando sua crença no cinema e no teatro.

Por trás da máscara: 50 anos de Persona
Onde:
Itaú Cultural – Av. Paulista, 149
Quando:
De 15/10 a 6/11; ter. e sex. das 9h às 20h; sáb. e dom. das 11h às 20h
Quanto: grátis

(1) Comentário

  1. Assisti este filme recentemente aqui em Joinville/SC no SESC (12/07/2018). Ele pode ser interpretado de diversificadas maneiras. Teve um debate com um psicanlista. Fez varias colocações, falou de psicoticos, casamentos fracassados, John Lennon (outra vibe). hoje vai ser exibido “A Hora do Lobo” de 1968, outro cinquentão, filme de terror, anida mais que é Sexta -Feira 13!!!! – marcio “osbourne” silva de almeida/jlle-sc

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