Sonho meu

Sonho meu
(Ilustração: Marcia Tiburi)

 

Lugar de Fala é o espaço dos leitores no site da Cult. Todo mês, artigos enviados por eles são publicados de acordo com um tema. O de fevereiro de 2021 é “sonho”.


No início estava ao longe. Mas poderia ser questionada. O país não estava preparado para enfrentar as doenças, digamos, cotidianas, quanto mais o novo coronavírus. Nem pensávamos o que iríamos viver. Veio o primeiro decreto estadual e o medo rondou nossas casas como se fosse um ladrão a roubar nossa dignidade, o contato físico que não poderíamos mais ter. E pior: era invisível. O inimigo era outro. Na verdade, ao longo da caminhada foram outros. E tem sido.

Sonho meu é que não existisse nenhum tipo de dor. Mas o que vemos é um surto de morte coletiva. Pessoas que estavam nas calçadas de casa e nos cumprimentavam já não existem mais. Pessoas que observavam outras a caminhar ficaram doentes, mas foram para o mundo espiritual em consequência de outra causa mortis. Profissionais que estão servindo a sociedade também adoeceram por erro de quem não queria desmarcar uma consulta. Sonho meu é que o vírus nem pudesse existir.

Porém, se ele habita entre nós, que possamos conhecê-lo para ter mais forças ao enfrentá-lo. Muitos se foram e famílias ficaram com o luto, a dor e a impotência para lidar. Sonho meu que as histórias dessas pessoas fossem contadas em vida, e não que virassem memória. Ninguém sabe lidar bem com a morte e com a perda de quem se ama. Sonhos foram aprisionados, a saúde mental de todos está um caco e algumas doenças já enfrentadas por todos mobilizam novo caos.

Pensamos que o novo é algo bom, que vem para nos trazer felicidade e encanto na vida. Contudo, o vírus veio como novo e alerta sem fazer pensar muito. Outro fator que corre contra nós é o tempo. É preciso tempo na pesquisa. É preciso tempo para salvar vidas. É preciso tempo para vacinar em massa. O tempo do lockdown chegou. Atrasado, mas talvez como um princípio de controle da doença.

Sonho meu é que tudo passe. Que as pessoas possam continuar a viver suas vidas com muito respeito por cada história, amor, abraços, contato físico sem medo. Sonho meu é que possamos aprender com tudo isso e ensinar nossas crianças tudo que foi vivido. Sonho meu é que tenhamos um pouco de paz neste país, e consequentemente, no mundo inteiro. Que saibamos colher os aprendizados a partir dos nossos corações.

 

 Caroline Santana, 37, é jornalista em Goiânia (GO)

 

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