O racismo estrutural como pilar da intolerância religiosa
Noite de Kizomba (Festa) no Kupapa Unsaba, Terreiro do Bate Folha, Rio de Janeiro (Foto: Roger Cipó)
Lugar de Fala é o espaço dos leitores no site da Cult. Todo mês, artigos enviados pelos leitores são publicados de acordo com um tema. O de fevereiro de 2020 é “intolerância religiosa”.
Brasil, um país laico, porém racista e retrógrado.
Se você é pobre, preto e periférico já deve ter imaginado como é difícil debater racismo no Brasil. Ainda que invisível, ele existe. Podemos identificar várias formas racistas e preconceituosas existentes na sociedade, uma delas é intolerância religiosa. A abolição da escravidão no Brasil aconteceu tardiamente e por consequência desta há mais do que imaginávamos por trás de tanta desigualdade social, política e financeira.
Quando falamos de racismo estrutural, abre-se um leque de conceitos e didáticas que podemos discutir. As religiões de matriz africanas são vistas como algo ruim, perverso, atroz, desumano e cruel.
Essa repulsa, aversão e ignorância sobre as religiões vêm de uma superioridade exacerbada do Cristianismo. Uma religião implantada e unificada no Brasil, excluindo e anulando a cultura local aborígene.
As religiões dos povos negros veio em meio à escravidão, com o tráfico negreiro. Chegando aqui, encontrou um Brasil colonizado por portugueses, adeptos ao Cristianismo. Para não serem mortos por cultuar sua religião matriz, associaram o candomblé ao catolicismo, criando então a umbanda, uma religião voltada para a prática da caridade.
A intolerância religiosa é tida como crime de ódio no Brasil, porém essa lei não tem nenhum comprometimento com a realidade do dia a dia dos candomblecistas. Não restam dúvidas de que esse preconceito é uma tentativa de excluir uma era de resistência dos escravos do Brasil.
A religião, é sem dúvida, um ato político em seu sentido histórico. Dentre vários outros fatores que precisam enfrentar, a agressão física é a mais difícil. Um terreiro de Umbanda em Ribeirão Preto foi atacado com bombas, tiros e pedradas. Um dos integrantes teve a boca e os dentes dilacerados. Mas nunca será noticiado. A dor preta não importa. A mulher negra vestida de branco com sua vela na mão ou a oferenda destruída numa encruzilhada não afetarão essa sociedade doente, racista e retrógrada.
Precisamos enxergar o racismo frente a frente. Entender que o racismo religioso existe é o primeiro passo para termos um debate centralizado e coerente. Esse crime que parece ser invisível aos nossos olhos está sempre presente no cotidiano do povo negro.
Se você é branco, cristão e defensor da moral e dos bons costumes, o seu papel é nos dar apoio moral, político e social. O chão que vocês pisam foi construído com o sangue e o suor dos meus ancestrais, vocês nos devem respeito e empatia. Não é mi-mi-mi, é consciência racial, é dívida histórica.
Laiela Santos é escritora e militante do Movimento Feminista Negro