O que é ser mãe para um pai
Lugar de Fala é o espaço dos leitores no site da Cult. Todo mês, artigos enviados por eles são publicados de acordo com um tema. O de outubro de 2021 é “maternidade”
“Quando você tiver seus filhos, você vai entender” dizia minha mãe. Pois é. Tem coisas que só fazem sentido com o tempo; que só sentindo na pele é que vamos entender como são as coisas. Por exemplo, dificilmente um homem vai entender o que sente uma mulher assediada. Podemos nos revoltar ou ficar indignados com a “classe” (machista), mas, assim como a dor do parto, só uma mulher sente na pele o que realmente é.
A maternidade é algo tão peculiar que mesmo as mulheres têm definições diferentes. Não há um conceito pré-estabelecido e fechado. É algo tão complexo que, só agora, começam a desmistificá-la. Estão desconstruindo o mito da “mãe perfeita”, daquela “maternidade de novela das 9”, em que a mocinha se casa com o protagonista, no final, tem um filho e a criança só come, dorme e sorri para as visitas. Fala-se na maternidade real, no outro lado da moeda, no que ela (também) representa às mulheres: solidão, exaustão, frustração, sacrifícios e invisibilidade. Há um ensaio muito interessante da fotografa americana Megan Jacobs, chamado Hidden Mothers, sobre uma das “atribuições” do cargo de mãe.
Não se enganem! É simplesmente indescritível quando um filho aparece, de surpresa, na cozinha ao aprender a engatinhar; ou quando esses “serzinhos”, do nada, dão seus primeiros passos. Obviamente que há muito mais pontos positivos do que negativos, mas ser mãe definitivamente não é apenas um mar de rosas.
Depois que me tornei pai, experienciei muitas coisas que me remeteram à minha infância: ao que vi, vivi e ouvi das lições dos meus pais. Me peguei repetindo algumas coisas, como comportamentos e falas, e “consertando” outras, afinal, “filho não vem com manual de instruções”. Nós, pais, vamos melhorando e adaptando as lições que aprendemos quando crianças. Referências, afinal, importam sim e são fundamentais na construção do ser humano.
Sempre vi minha esposa pesquisando sobre educação não violenta, a importância da rotina para os bebês e crianças, cuidados com alimentação, sobre receitas de papinhas saudáveis e naturais para os nossos filhos, porcionando-as para as refeições fora de casa, separando roupas, fraudas, etc., ao mesmo tempo em que me dava alguma dica ou conselho de trabalho (ambos temos a mesma profissão) ou simplesmente me ouvindo tagarelar.
Mãe é assim, né? Tem que antecipar, proteger, cuidar, educar, confortar, fortalecer … e se algo dá errado, se culpam. Carregam o peso do mundo nas costas. Enquanto nós, pais, fazemos 1 coisa por vez, elas fazem 50. Muitas vezes, colocam seus sonhos, carreiras e prioridades de lado, se sacrificam e sempre acham que não fizeram o suficiente.
Não podemos generalizar, é claro… há as mães que são “ponto fora” da curva, porém, estas são em (bem) menor número do que os pais irresponsáveis e ausentes, que não cuidam dos filhos; que saem para tomar aquela cervejinha sem hora para voltar; ou, que somem e não são “homens” para assumir seus filhos; ou, pagar uma pensão condigna e, assim, acabam por jogar toda a responsabilidade de se educar e criar um filho (como é de hábito) nas costas das mulheres.
Na pandemia, pude dividir bem mais as responsabilidades domésticas com minha esposa. Estou aprendendo como funciona essa tal “antecipação”, sobre responsabilidade afetiva, educação não violenta, etc. Ainda estou em estágio probatório, mas acho que estou bem melhor do que antes.
Pude perceber o quanto a mãe sofre na pandemia: tem que trabalhar, mas tem que dar atenção e cuidar do filho; está exausta, mas arranja forças para brincar, cantar e dançar com os pequenos; quer descansar, mas senta com paciência para ler uma história ou escutar alguma aventura dos pequenos exploradores; com uma mão, enxuga suas lágrimas e com a outra faz cafuné; muitas vezes se tornam “mães” de seus pais ou maridos; e por aí vai. Se “explodem”, logo se culpam. Elas dão conta de tudo, mas pensam que não dão conta de nada. Muitas vezes não enxergam o quanto fazem e, ainda assim, se culpam por não terem podido fazer mais do que suas forças permitem. Dão 110% de si e isso não é o suficiente para elas. Não há ninguém além das mães que desafiam os limites do amor, do sacrifício e do altruísmo.
Ser mãe, aos olhos de um pai, é ser esse ser extraordinário, que ilumina um lar, que é a alma da família (muitas vezes sem nem mesmo perceber isso); que promove o amor, a união e a harmonia entre os membros da família e, mesmo com tudo isso, viver na culpa e na exaustão física e mental. Aos olhos da família, são muitas vezes invisíveis, como se só os filhos tivessem importância. Se o filho se torna um adulto “torto”, a culpa é de quem?! Adivinhem… É, já dizia minha mãe: “ser mãe é padecer no paraíso”.
Só posso concluir que os anjos, de fato, existem e, aqui, encarnados no reino terrestre, eles são designados pela alcunha “mães”, afinal só elas sabem, ao fim e ao cabo, o sentido empírico das palavras sacrifício, abnegação e amor incondicional e não serem devidamente valorizadas e respeitadas por isso.