Angústia

Angústia

 

Lugar de Fala é o espaço dos leitores no site da Cult. Todo mês, artigos enviados por eles são publicados de acordo com um tema. O de dezembro de 2021 é “angústia”


Vivia a quatro paredes à espreita da janela.
Minha casa era grande.
A mobília tentava preencher o espaço que se vem vazio.
A janela era minha parte preferida: grande, mas sempre fechada.
A forte ventania constrangia a sua abertura.
Do outro lado, um horizonte verde.
Bonito.
Distante.
É tão bom deslumbrar o que se existe após uma fresta…
O que está lá fora não é tão longe –
diz o instante que mira o horizonte.

Quando miúda e de alma grande me encantei com um ovo.
Pequeno, arredondado, quente. Era de um canarinho cansado, miúdo também, e enjaulado, companheiro da minha mãe.
Tirei -o daquela jaula para colocar em outra.
Minhas quatro paredes envolviam o ovo na expectativa por ele nascer.
Aguardei.
Sairia um filhote…
Desmedido?
De peito quente para voar?
Ah….Cuidei, mais que uma mãe, para assistir seu despontar: com certeza, esse vai atravessar qualquer aresta.

Esperei. Desejei. E Sofri:
testemunhei um nascimento que não teve início. Só fim. 

Me assustei. Não compreendi.

Como pode um corpo quente, pronto para se abrir….

Não sai da casca…..

É contido.
pelo oco que cerca.

Era só mais um miúdo…
também de alma grande.

Victoria Boiteux

 

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