Plataforma online Vídeo nas Aldeias disponibiliza documentários de cineastas indígenas

Plataforma online Vídeo nas Aldeias disponibiliza documentários de cineastas indígenas
O Vídeo nas Aldeias dedica-se, desde 1986, à formação de cineastas indígenas (Divulgação)

 

Oito mil horas de filmagens em 88 filmes sobre mais de 40 aldeias indígenas: este é o tamanho do acervo do Vídeo nas Aldeias (VNA), iniciativa que, há 32 anos, se propõe a difundir a produção cinematográfica entre povos brasileiros. A coleção, até então de difícil acesso, foi disponibilizada na última semana em um portal pago – semelhante aos principais sites de streaming digital –, que reúne tanto filmes de cineastas indígenas quanto produções sobre os indígenas, com foco nas aldeias.

“É um espaço para agregar toda essa produção, que é muito rica, com o objetivo de facilitar o acesso das pessoas”, explica à CULT o antropólogo e cineasta Vincent Carelli, que criou o Vídeo nas Aldeias em 1986, então como uma forma de levar às comunidades a linguagem cinematográfica. Ele conta que a ideia principal por trás do novo site é dar visibilidade a um acervo que poderia se perder com o tempo. “Estamos saindo de um sistema antiquado e que até dá prejuízo – o DVD, a entrega pelo correio – e indo para uma forma mais direta de chegar ao público”, diz Carelli.

Entre as películas disponíveis no portal estão filmes do antropólogo e de outros documentaristas, como Corumbiara (2009) – sobre o massacre no município de Corumbiara (RO), em 1995 – e Martírio (2016), sobre a luta dos Guarani Kaiowá pela retomada de suas terras, documentário premiado no Festival de Brasília, na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo e no festival Janela, de Recife.

Entretanto, pelo menos dois terços dos documentários são de cineastas indígenas (ou de cooperações entre indígenas e não-indígenas): Kîsêdjê ro sujareni – Os Kisêdjê contam a sua história (2011), de Kamikiã Kisêdjê e Whinti Suyá; Já me transformei em imagem (2009), em que o cineasta Zezinho Yube fala sobre seu povo, os Huni kui; e As hiper mulheres (2011) – uma investigação sobre Janurikumalu, o maior ritual feminino do Alto Xingu (MT) – são alguns dos exemplos.

As hiper mulheres from Vídeo nas Aldeias on Vimeo.

Disponível desde 16 de abril, a videoteca virtual do VNA funciona como uma plataforma de streaming, na qual o usuário paga para ter acesso ao conteúdo, seja online ou por meio de downloads. A quantia, no entanto, depende do tamanho do filme (curta, média ou longa-metragem) e da forma de consumo – aluguel ou compra. O único filme gratuito é Martírio, “um filme tão importante, politicamente falando, que não tem como ser vendido”.

Segundo Carelli, a plataforma é paga para gerar renda para o VNA, que passa por dificuldades financeiras há cerca de três anos. Por hora, os fundos vêm de editais de cinema como o Funcultura (de Pernambuco), mas o dinheiro, de acordo com o antropólogo, é insuficiente para financiar o ensino de cinema, maior característica do VNA. Desde 1997, quando começou a investir na formação cinematográfica, a organização financiou 127 oficinas práticas voltadas para o público indígena, mas “hoje, embora a produção cinematográfica do VNA continue a todo vapor, não temos mais meios de organizar as oficinas”, explica Carelli.

O antropólogo explica que o dinheiro que entrará pela plataforma será dividido quase igualmente entre os cineastas (que ficarão com 35% dos ganhos), as comunidades indígenas envolvidas (que receberão 35%) e o próprio Vídeo nas Aldeias (30%), para custos de manutenção do acervo e de equipamentos.

Carelli espera que os visitantes do site se tornem apoiadores do Vídeo nas Aldeias – dentro da plataforma, existe a possibilidade de ajudar, mensalmente, com R$ 30, R$ 60, R$ 90 ou R$ 120. Ele afirma que, com um Estado atrelado à bancada ruralista, que “nega até os direitos mais básicos dos povos indígenas”, a saída para a cultura está em iniciativas de colaboração como o VNA. “Com essa crise política, em que o governo não nos representa, entramos na era do financiamento coletivo: criamos redes colaborativas dentro da sociedade civil e seguimos lutando. Estou botando fé”, finaliza o antropólogo.

 

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