Intelectuais se articulam em defesa de Paulo Freire como patrono da educação brasileira

Intelectuais se articulam em defesa de Paulo Freire como patrono da educação brasileira
O educador e filósofo Paulo Freire, patrono da educação brasileira (Divulgação)

 

Nas últimas semanas, membros do Instituto Paulo Freire (IPF) e apoiadores do pensamento do educador têm se articulado dentro e fora do Brasil contra uma petição online do movimento Escola Sem Partido. Publicada no portal do Senado, a campanha pede apoio na revogação da Lei 12.612, que instituiu Freire como patrono da educação brasileira no governo Dilma Rousseff. 

O abaixo-assinado foi redigido por uma estudante de direito e membro do Escola Sem Partido, Stefanny Papaiano, e coloca o filósofo como “doutrinador” e “marxista”: “O sócio-construtivismo é a materialização do marxismo cultural, os resultados são catastróficos e tal método já demonstrou em todas as avaliações internacionais que é um fracasso retumbante” [sic], diz o texto. De 13 de janeiro até 11 de outubro, a página reuniu 21.112 assinaturas – ultrapassando as 20 mil exigidas para uma petição informal pode ganhar status de Sugestão Legislativa e ser analisada pelo Senado, podendo transformar-se em Projeto de Lei. 

“Assim que ficamos sabendo, escrevemos outra petição como forma de alertar as pessoas sobre o que está acontecendo e travar o avanço do abaixo-assinado do Escola Sem Partido”, conta a diretora pedagógica do IPF Ângela Biz Antunes. O documento em defesa de Freire, escrito em português, inglês e espanhol, faz cinco considerações sobre a importância do pensador, destacando que seu legado intelectual “vem sendo aplicado em todos os níveis, modalidades e graus de ensino, em diferentes lugares do mundo”.

Já na segunda (16), quando a petição do IPF foi ao ar na plataforma online, 400 assinaturas foram reunidas; até a última segunda (23) havia 22.211 – incluindo representantes de instituições como a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação, a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação e o Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo. Além das instituições, se prontificaram a apoiar a causa a Deputada Federal Luiza Erundina (PSOL), autora da lei que institui Freire como patrono; Daniel Cara, da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, e Ana Maria Araújo Freire, conhecida como Nita Freire, viúva do pensador e responsável por todo o seu acervo.

Para além do Brasil, instituições internacionais também assinaram a petição, repudiando o Escola Sem Partido. A Universidade de Stanford, a Korbel School of International Studies e a Universidade de Denver são algumas delas, junto aos IPFs da Argentina, da África do Sul, de Cabo Verde, dos Estados Unidos, da Espanha, da Alemanha, de Portugal e da Itália. Há, ainda, assinaturas de intelectuais como Manuel Castells, Joelle Cordesse, Ramon Moncada e do ex-ministro de educação da Nicarágua, Carlos Tünnermann Bernheim.

Com Paulo Freire, em Nova York, 1988 (Acervo pessoal)
Nita com Paulo Freire, em Nova York, 1988 (Acervo pessoal)

“Quando ouviram falar que o Brasil queria apagar Paulo Freire da educação, nossos parceiros internacionais ficaram chocados. Fora do país, Freire é o intelectual brasileiro mais citado em trabalhos acadêmicos”, diz a diretora, mencionando uma recente pesquisa da London School of Economics, segundo a qual o livro Pedagogia do oprimido (1968) está entre os três mais citados na área das ciências sociais – e entre os 100 mais pedidos e consultados por universidades de língua inglesa.

Além da petição, que agora segue para o Senado, os apoiadores de Freire organizaram, entre os dias 14 e 18, o Coletivo Paulo Freire por uma Educação Democrática. Encabeçado por Erundina, Nita Freire e Daniel Cara, o grupo tem como objetivo debater o futuro da educação do país de forma prática e democrática. “Queremos fazer aulas públicas, sediar debates e abrir espaço para apresentar o pensamento de Freire, porque há uma concepção equivocada do que ele defendia”, define Antunes.

Nesta segunda (23), o nascimento do Coletivo foi marcado por um encontro que reuniu 200 pessoas na PUC-SP, instituição em que Freire ensinou por 17 anos. Na mesa do evento, estiveram presentes, além dos três fundadores do grupo, a professora Ana Maria Saul, representando a Cátedra Paulo Freire da PUC-SP; Moacir Gadotti, do IPF, e o ator Paulo Goya – que ficou responsável pela leitura do manifesto que registra as diretrizes e objetivos do Coletivo.

“Defender Paulo Freire como patrono da educação brasileira é defender nossa produção intelectual, a boa prática pedagógica e o próprio Brasil”, leu Goya. Em sua fala, Daniel Cara complementou: “A ideia do Coletivo Paulo Freire nada mais é do que propor uma luta em torno de um pensamento construído no Brasil que é referência no mundo inteiro, mas que está sendo desvalorizado”.

Problematizador, não doutrinador

Paulo Freire (1921-1997) foi um estudioso da educação cuja obra, reconhecida mundialmente, foi premiada pela UNESCO em 1986. Foi também o brasileiro mais homenageado da história, acumulando 41 títulos de Doutor Honoris Causa de universidades no mundo inteiro. Entre 1989 e 1991, foi Secretário de Educação do Município de São Paulo, na gestão de Erundina, embora seu método pedagógico não tenha sido aplicado nas escolas públicas brasileiras. Em 2012, uma votação unânime da Comissão de Educação, Cultura e Esporte do Senado, conferiu ao pensador o título de patrono da educação brasileira.

“Ao contrário das acusações do Escola Sem Partido, Freire não é doutrinador, mas problematizador de uma educação passiva e hierarquizada”, coloca Antunes. A pedagogia freiriana prevê a formação de indivíduos críticos e ativos por meio de uma educação respeitosa e sempre baseada no diálogo, dentro da qual a democracia e a igualdade possam ser construídas de maneira consciente. “Se as pessoas que criticam Freire lessem o que ele escreveu, não estariam votando para retirá-lo do posto de patrono da educação”, pondera a diretora.

Uma das maiores preocupações dos envolvidos no coletivo é a justificativa leviana do Escola Sem Partido para a retirada, segundo a qual o educador seria um “filósofo de esquerda” cujo método de educação se basearia “na luta de classes”. “Dizer que Paulo Freire é doutrinador é desconhecer profundamente a proposta dele, que é sobre diálogo, sobre viver a democracia em todo o seu conflito e a sua diversidade, nunca de forma imposta”, afirma Antunes. 

No evento de inauguração do Coletivo, a professora Saul opinou que, talvez, não haja interesse da parte dos críticos em conhecer, de fato, Paulo Freire, já que sua forma de pensamento “irrita as elites ultraconservadoras e fascistas de nosso país”. Para Daniel Cara, porém, não há momento melhor para recuperar o pensamento freiriano. “Retomar a obra de Paulo Freire talvez seja o único caminho para vencermos este movimento ultraconservador brasileiro”, disse.

Nita Freire concorda: “Os movimentos de direita estão dizendo que o Brasil não merece Paulo Freire, que o Brasil não quer Paulo Freire. Mas nós lutamos por um homem que é o maior educador da história do Brasil, e um dos maiores educadores do mundo ”.

(1) Comentário

  1. Paulo Freire é fake. Vocês sabem disso…
    Ele é patrono da deseducação nacional e responsável por ter lançado o Brasil para os últimos lugares nos testes internacionais de educação. Não se conhece uma mente brilhante que tenha sido educada pelo seu método. Em revanche, os danos cerebrais que o sócio-construtivismo provoca são irreversíveis.

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