Narcisismo ressentido, o sintoma nacional que chegou ao poder

Narcisismo ressentido, o sintoma nacional que chegou ao poder
Christian Dunker: Falta no Brasil o senso de pertencimento do sujeito ordinário, na qualidade de um entre outros (Foto: Luiz Maximiano)

 

O psicanalista Christian Dunker procura entender os problemas de saúde mental em sua articulação com os processos políticos e sociais, estabelecendo, por exemplo, uma correlação entre depressão e neoliberalismo. Para ele, a abordagem atual e predominante do sofrimento e dos transtornos mentais que enfatiza os medicamentos e evita compreender esses males além dos sintomas menospreza a importância das experiências transformativas, como a implicação no outro, a narração da experiência traumática e os valores de comunalidade para perspectivar o futuro.

Dunker é professor titular de Psicanálise  e Psicopatologia do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP).  Escreve colunas em publicações digitais e mantém o canal Falando Nisso, no YouTube. Seu livro mais recente é Uma biografia da depressão (Paidós), lançado em fevereiro de 2021. Coordena, com Vladimir Safatle e Nelson da Silva Jr., o Laboratório de Teoria Social, Filosofia e Psicanálise (Latesfip-USP). Na entrevista a seguir, ele discute os efeitos da pandemia do novo coronavírus no psiquismo dos brasileiros, por que o Brasil tem uma democracia para poucos, como o país se  tornou campeão mundial em ansiedade e o que explica as epidemiasmundiais de solidão e depressão.

É possível traçar um perfil psicológico de Jair Bolsonaro baseado em seu comportamento público?

Em geral, evitamos fazer juízos clínicos de figuras públicas, pois se entende que seria uma apreciação da vida privada da pessoa. Mas é uma questão que não pode ser evitada, principalmente quando há efeitos de genocídio. Dito isso, me parece que Bolsonaro tem um funcionamento narcísico muito problemático. Alguns veem sinais de uma personalidade antissocial, mas, se fosse esse o caso, ele não teria tanto apego infantil aos filhos, à família e à defesa de uma virilidade imaginária. No fundo é aquela pessoa limitada cognitivamente de baixa inteligência relacional que só consegue pensar em um plano retilíneo de vingança imaginária. Cria uma polarização muito pessoal, tendente à paranoia sistêmica. É alguém que calcula permanentemente a imagem que mostra para as pessoas. Isso produz um estado de solidão, pois aqueles que conseguem competir narcisicamente com ele são objetos de perseguição. Jacques Lacan disse que tem um tipo de pessoa que não devemos atender, os canalhas. Traça sua origem na França do século 18, como um tipo de cínico. Se essa pessoa percebe a origem de sua canalhice, torna-se débil. Para mim, Bolsonaro é um canalha nesse sentido.

O discurso do presidente em relação à  pandemia se baseia exclusivamente no  indivíduo. Ele se mostra convencido de que sobreviverá. O que leva uma pessoa a acreditar que é indestrutível?

Esse é um tópico clássico de funcionamento narcísico. A pessoa que se sente irrelevante, com poucos dotes e qualidades, encontra para si a crença de que isso é apenas aparência, porque na verdade seria uma pessoa muito especial, predestinada, que tem algo que não sabe dizer o que é mas que o torna exceção em relação à lei. Pessoas com transtorno narcísico semelhante ao de Bolsonaro têm essa convicção de que são escolhidas. Ou é o dedo divino que as protege, ou é porque são da família tal, ou porque nascem com saco roxo, têm histórico de atletacada um vai construir uma mitologia. 

A pessoa se condena: se fez algo excepcional, não é nada demais; se não fez, ela se encontra em uma espécie de déficit que gera ressentimento por meio da ideia de que tem alguém roubando um fragmento de seu gozo por não reconhecer sua excepcionalidade. Em certo sentido, Bolsonaro é uma criança mimada daquelas que Machado de Assis descreve [no personagem Brás Cubas]. Tem a leniência dos pais e uma educação postiça: pode fazer tudo porque papai o segura lá em cima. É um sintoma nacional que chegou ao poder.

Ao agir assim, Bolsonaro nega o reconhecimento do outro?

Esse é um processo discursivo que está na raiz da eleição de Bolsonaro: a negação da existência e da vida do outro. A consequência é a falta de empatia, que não passa de excesso de identificação com aqueles que são como ele um modelo de ser humano. É algo muito relacionado ao processo que chamei de cultura de condomínio, um espaço artificial intramuros, expropriado do espaço que seria público, e onde se imagina que a vida segue para aqueles que merecem viver, enquanto os que estão do outro lado do muro são quase-pessoas, atrapalhando a vida de quem está dentro. Essa é a proposta explícita da democracia customizada, para poucos.

Estamos num momento da pandemia em que o horizonte positivo trazido pela vacina convive com uma presença cada vez maior da morte na vida de todos. Como isso se reflete no psiquismo dos brasileiros? 

Respondo com um dado da pesquisa nacional sobre os sonhos [tema do dossiê da Cult de fevereiro]. Em um primeiro momento, os sonhos se relacionavam muito com casa e mãe. Depois tornaram-se mais contínuos com o cotidiano, mais próximos do sonho depressivo como o de andar numa praia sem ver o fim. Agora os sonhos se tornaram mais violentos, repletos de contradições e contrariedades, algo característico de um momento no qual vislumbramos um fim. Quando isso acontece, inicia-se um processo de ressignificar a jornada, e muda nossa relação com as perdas que tivemos, os lutos malpostos, retidos, negados também pelo discurso público, que transforma mortes reais e singulares em números e curvas. Nosso desejo e nossa potência de transformação são avivados. Antes, o aparelho psíquico havia se adaptado ao isolamento e nos fechamos para evitar a contradição e a angústia. Agora, podemos suspender essa inibição. É um momento de emergência de conflitos individuais, familiares, institucionais e políticos.

Um dos conceitos fundamentais da psicanálise é o luto, que se relaciona com a depressão. Como entender esse momento em que muitas vezes não há tempo nem oportunidade para o luto? 

O luto não está presente apenas quando perdemos alguém, mas é uma condição para que consigamos nos separar dos outros, seja no término de um grande amor ou de um emprego, ou ainda numa mudança de fase na vida. É um processo profundamente individual, mas não ocorre sem momentos coletivos de despedida funeral, velório, rememoração conjunta. O trabalho de lembrar e falar daquela pessoa é absolutamente fundamental para que o luto vá em frente e para que, no fim, o sujeito lembre daquele que se foi com mais saudade do que dor. Temos uma espécie de dialética do luto, entre o trabalho individual de recolhimento interior e o momento no qual é preciso o outro para realizar a perda. É uma mediação entre os que estão aqui, os que se foram e aqueles que virão. Na impossibilidade de contar e nomear as pessoas que se foram, acontece um retorno do real na forma de violência. Mais à frente haverá uma nova fratura e um novo circuito de violência. É o retorno de um trauma que não passou pela realização apropriada do luto.

Neste segundo ano de pandemia, a repercussão do Big Brother Brasil, um programa que se baseia no confinamento, ampliou-se muito. A que você atribui isso? 

Tivemos um Big Brother muito diferente, que nos colheu em uma espécie de encruzilhada. Primeiro porque temos uma cultura na qual há o sintoma das estruturas em condomínio. O Brasil já tinha, portanto, predisposição para receber bem e cultivar um programa em que pessoas estão fechadas num mundo à parte. Inicialmente era uma relação metafórica entre o mundo de fora e o micromundo ali dentro. Um se relacionava com o outro, mas sem continuidade. Na pandemia, essa relação metafórica se apresentou como uma extensão metonímica do mundo no qual efetivamente vivemos. Os participantes do programa estão agora como nós, fechados em casa, potencializando os conflitos que todos estão vivendo. Isso remeteu à verdade recalcada do Brasil: o condomínio não é o outro mundo; é o nosso, que não queremos ver. O mundo da exclusão, da violência, do preconceito. Quando temos esse curto-circuito, começamos a ver relações de força e opressão que sempre existiram, mas que agora parecem exageradas. As gramáticas de reconhecimento e exclusão apareceram de forma explícita, o que tornou esse programa capaz de fazer a catarse no sentido próprio do termo: purificar os sofrimentos. Aquela realidade artificial chegou perto demais da nossa realidade natural.

Christian Dunker (Foto: Luiz Maximiano)
Christian Dunker: Junto com o neoliberalismo, a linguagem digital trouxe uma parasitagem do espaço público pelo privado e vice-versa(Foto: Luiz Maximiano)

Há poucas semanas, o Japão criou um Ministério da Solidão. O Reino Unido já havia feito o mesmo em 2018. Como você vê essas iniciativas à luz da distinção entre solidão e solitude? 

Esse é um tema emergente, que remete a um tópico formativo da modernidade e de nosso processo de produção de indivíduos. É uma conjunção entre processos de individualização e de narcisismo. Temos um sujeito que, simultaneamente, sofre com a solidão e inquieta-se porque esse estado não lhe traz a felicidade esperada. Ele se recolhe para uma conversa consigo, o que prejudica a economia de afetos restaurativos solidariedade, empatia, vivacidade, boa resolução com os que se foram e os que vão chegar. Por isso a importância do outro termo, solitude” – a capacidade de estar consigo quando o eu não se apresenta como unidade nem como identidade. É o ponto aonde chegamos após ultrapassar a ilusão da solidão como máscara de independência e autonomia. Na Dinamarca e na Suécia dos anos 1980 existiram correlatos dessas campanhas quando aumentaram os índices de suicídio e solidão patológica associada à depressividade no sentido clínico. Nesses países havia a campanha Jante com a família, porque comer ou beber sozinho produz um estado de solidão propenso a patologias sociais e disfunções da saúde mental. Isso foi antes da linguagem digital, que trouxe consigo o incremento da solidão.

Qual é a relação entre o digital e a solidão?

Minha hipótese é que, junto com o neoliberalismo, a linguagem digital trouxe uma parasitagem do espaço público pelo privado e vice-versa. Não é o privado que é destruído, mas a intimidade entre o eu e o outro. Na intimidade, não é preciso haver os mesmos traços de identificação, mas estar junto nas experiências de indeterminação, em uma viagem que não se sabe aonde vai dar. A ideia central na minha produção, acadêmica e clínica, não é que o sofrimento vai nos salvar porque por si só ele não gera nada, mas é matéria potencial para a experiência comum. A morte e a finitude são experiências desagradáveis, mas criam comunalidade se conseguirmos narrar nossas deficiências, faltas e vulnerabilidades, e fazer partilha social de afetos. No fundo, a solitude está ligada à capacidade de suportar o abismo da angústia. 

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), em 2030 a depressão será a doença mais comum do mundo. Por que essa previsão?

A primeira ponderação a fazer é que a depressão se tornou uma modalidade quase obrigatória de sofrimento. Isso aconteceu por uma transformação da racionalidade diagnóstica na psiquiatria e na psicanálise. Até 1973 tínhamos um olhar para o sofrimento que presumia uma estrutura narrativa em que se compartilha o sofrimento com o outro enquanto se sofre. [Sigmund] Freud descobriu isso no neurótico, que começa a falar de seus sintomas e passa para a história de sua vida, a ponto de não conseguir separar as duas coisas. É uma narrativa torta, que confirma e produz o sofrimento. Com a formulação proposta por Robert Spitzer [psiquiatra estadunidense que foi um dos responsáveis pela organização do Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais], substitui-se a hipótese causal por uma lista de formas de sofrimento que descrevem apenas a regularidade: problema de sono, baixa libido, menos apetite, dificuldade para começar algo novo, perda de prazer nas coisas do dia a dia, afeto rebaixado, tristeza, culpa, autocrítica permanente etc. Por essa lógica, se uma pessoa tem 8 de 13 sintomas, é depressiva, ansiosa ou tem transtorno de estresse pós-traumático. Estudam-se apenas os signos patológicos. Quando se faz isso, inflacionam-se certos diagnósticos e deflacionam-se outros. Em 40 anos, a depressão, que era quadro secundário, tornou-se a quinta causa de afastamento do trabalho. Hoje há 14  diagnósticos diferentes para ela. Ao mesmo tempo foi inventada uma medicação para a depressão. Mas como explicar que hoje a mesma substância antidepressiva tenha 30% a 40% menos eficácia do que quando foi inventada? O cérebro é o mesmo? Sim e não, pois os cérebros são absolutamente singulares, têm funções semelhantes mas são como impressões digitais. Será que o martelo não criou pregos? 

Christian Dunker (Foto: Luiz Maximiano)
Christian Dunker: A depressão é um caminho para aceitarmos a perda e nos separarmos dela (Foto: Luiz Maximiano)

Em Uma biografia da depressão, citando Melanie Klein, você lembra que a depressão é uma tentativa de cura. Na prática  da psicanálise, de que forma isso pode  ser elaborado?

As formas de sintomas e loucuras são exageros de recursos úteis. Alucinações, delírios e ideias obsessivas servem a alguma coisa quando são reduzidos e colocados em contexto. A depressão é um caminho para aceitarmos a perda e nos separarmos dela. Toda construção da subjetividade começa com a não perda. O prazer fica consigo e tudo aquilo de que não se gosta é cuspido para fora. Para Melanie Klein, cinde-se assim o objeto: a face boa e idealizada está comigo e lá fora está a face péssima mas ela volta. O mundo parece nos perseguir porque colocamos para fora o que não gostamos, numa posição esquizoparanoide. O sujeito cura-se ao perceber que o objeto ruim é tão existente quanto aquele considerado bom. Para fazer isso, é preciso perder o objeto idealizado que se tinha, fazer o luto dele. O sujeito poderá até se desorientar na vida, pois, sem o inimigo a nos perseguir, não sabemos mais para onde vamos. Aquele que aceita sua perda é convidado a reparar o que fez para depois se transformar em outra pessoa. A depressão, nesse caso, é cura. Quando a perda não é aceita, forma-se uma depressão clínica.

Como enfrentar de forma pública essa questão singular?

O retorno à singularidade depende de cada um, de como se enfrenta o mal-estar e se encontram soluções para a felicidade. Mas temos muitas coisas a fazer coletivamente também. Não é mais razoável pensar que só se deve ocupar da saúde mental quando há transtorno, até porque os novos diagnósticos transformaram 93% da população brasileira em transtornados. Falamos ostensivamente em cuidados com a alimentação, exercícios físicos, dietas, mas onde fica a formação em nossas escolas para o cuidado consigo, para a escuta? Para o papel formativo e transformativo da cultura? Experiências culturais nos protegem das doenças mentais nas peculiaridades da relação com a leitura, no aprofundamento da capacidade de interpretação do mundo e de localizar-se nele. No lugar disso está a saúde mental prêt-à-porter, e depois tem-se uma franja de práticas médicas que deixaram de curar e passaram a criar ciborgues. 

Por que o Brasil é o campeão mundial em ansiedade?

A ansiedade é uma compleição determinada da angústia. Na origem da palavra está o anseio, o que se espera para o futuro. Mas ansiar significa também que pode não acontecer, e é preciso integrar isso em nossa rede de expectativas. No Brasil, pensar no futuro beira o imponderável, com tanto patrimonialismo, jeitinho brasileiro, trapaça nas empresas e no Estado. Conheci alguns países da África de uma pobreza endêmica, mas com zero ansiedade. Estão presos à sua vida rural, mas sabem como vai ser mais ou menos o amanhã e o tamanho do que podem sonhar. No Brasil temos fatores como a insegurança alimentar e uma irregularidade na interpretação das regras que produzem incerteza sobre o futuro e a depressão massiva. É uma cultura que pune quem não está na rota do narcisismo.

Você percebe uma presença progressiva de ansiedade e depressão em crianças? 

Se não existirem experiências relacionais ricas, interessantes, produtivas, a pessoa adoece. Tais experiências tomam tempo, e esse é o problema. É preciso escutar o sofrimento antes que ele se torne sintoma. O que acontece é que os responsáveis podem até estar com as crianças, mas elas não são tratadas como sujeitos, e sim como uma agenda. Comer, ir para a cama, fazer a lição, cortar o videogame quando é excessivo, ir para lá e para cá, como uma espécie de animal de estimação com uma pauta administrativa. Não se vê a prática de experiências que produzem intimidade e comunalidade. Não se pensa o sofrimento da criança junto com ela, o que fazer com isso, como transformar-se a si e ao mundo. Na clínica dizemos que é preciso procurar ajuda quando a criança não brinca ou sente angústia e sono limitantes. É muita falta de bom senso aparelhar a vida psíquica das crianças como extensões narcísicas de seus pais, exigindo que sejam produtivas desde pequenas.

Em um de seus vídeos, você recomenda aos pais que estejam atentos para não criar pequenos bolsonaros. O que eles devem observar para que isso não aconteça?

Bolsonaro é um exemplo do exato contrário do que propomos. Em vez de preferir a conversa e diversificar caminhos, exerce o poder com humilhações e agressões físicas. E do outro lado há o gozo da transgressão: beber, fumar, desdenhar da lei como fatores para ser alguém dentro do condomínio. Falta no Brasil o senso de pertencimento do sujeito ordinário, na qualidade de um entre outros. Aqui a cidadania não é para todos: se não quiser ser excluída ou assassinada pela polícia, a pessoa acredita que precisa ser especial. Para isso, aprendem-se prazeres de segregação, que engendram problemas como racismo, homofobia, misoginia. Bolsonaro é esse sonho de consumo da classe média: pega em armas, goza como quer, protege sua família e manda todo mundo se ferrar. 

Qual relação pode ser estabelecida entre os processos identitários e os processos políticos contemporâneos?

É incrivelmente recente a percepção social de que somos uma sociedade racista, que não ajustou contas com a escravidão. O identitarismo é uma nova forma de fazer política, interessante pelos avanços concretos, mas que pode ser questionada do ponto de vista teórico: enfatizamos a dimensão expressiva das identidades em detrimento da dimensão representativa, pelo voto. Há dificuldade de tornar essas pautas mais palpáveis para que não sejam alvo fácil de instrumentalização fascista como temos visto. Abriu-se muito facilmente o caminho para o pensamento de que se pode ser machista já que se pode ser feminista. Sabemos que não são relações simétricas, pois há minorias excluídas historicamente. Contudo, as coisas são resolvidas com mais ressentimento do que seria necessário, além de uma polarização improdutiva. É preciso mais raciocínio estratégico e consideração com o plano da representação pelo voto, e menos percepção de que o sujeito é uma ameaça. Faltam projetos de articulação entre minorias. Sou criticado por isso, mas acho que sem um certo universalismo as identidades tendem a ser dissolvidas entropicamente no próprio narcisismo.

Como se dá a relação com a culpa na direita e na esquerda? 

Cada qual produz seu universo de culpas. Quando acontece uma tragédia, a reação típica é procurar um culpado porque não aguentamos viver com coisas que não têm sentido: O vírus veio de Wuhan, então tem um chinês por trás disso. Não é assim que funciona. Há coisas que não têm sentido. Encontrar alguém para culpar faz o sujeito gozar gostoso e se sentir melhor por não ter sido ele quem errou. O que a pessoa incauta não percebe é que isso a torna dependente da culpa para sentir o frescor de alma libertada. As pautas identitárias nesse ponto não ajudam, pois facilmente tem-se proliferação de culpados e caça aos privilegiados. Não se trata disso: é luta de classe, não ressentimento de classe.  


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