Enfim, seremos vacinados… e o que isso quer dizer?

Enfim, seremos vacinados… e o que isso quer dizer?
(Foto: Montvlov/Arte Revista Cult)

 

Lugar de fala é o espaço dos leitores no site da Cult. Todo mês, artigos enviados por eles são publicados de acordo com um tema. O de janeiro de 2021 é “perspectiva”.


Enfim, a vacina chegou. Finalmente, nós, brasileiros, recebemos uma notícia boa em meio ao mar de incertezas, angústias e revoltas que nos trazem de mãos dadas a covid-19 e o governo Bolsonaro. Mas é necessário acalmarmos os ânimos e colocarmos os devidos pingos nos “is”.

Importante pontuarmos que, do ponto de vista legal, Doria não fez mais do que sua obrigação em correr atrás de uma vacina, na medida em que a Constituição Federal estabelece textualmente que a saúde é direito de todos e, por sua vez, dever máximo do Estado, conforme previsto no RE nº 855.178-SE, de relatoria do Min. Edson Fachin e no AI nº 550.530-PR, de relatoria do ex-Min. Joaquim Barbosa. Cabe, portanto, aos entes federados a busca pela redução do risco da doença e o acesso universal e igualitário
às ações e serviços para a promoção, proteção e recuperação da saúde. É o que nos diz o artigo 196.

Dória, portanto, não é um herói nacional ou um salvador da pátria, mas apenas e tão somente usou seus neurônios e a oportunidade política para se destacar no palco das eleições presidenciais de 2022. Pensou, coisa que Jair Bolsonaro raramente faz. Achar que o governador paulista é um herói é repetir a máxima “o Maluf rouba, mas faz”. Pois é, é sua obrigação fazer… e, mais! Não roubar. Não se trata de um favor de qualquer governante, mas de uma obrigação constitucionalmente instituída.

Jair, “o anti Messias”, entretanto, sofreu uma derrota acachapante do ponto de vista político: perdeu a guerra das vacinas contra João Doria. Não é nenhuma dúvida que o nosso presidente sempre negou a vacina e condenava as recomendações sanitárias quanto ao uso de máscara e distanciamento social. Não nos cabe agora relembrarmos todas as suas traquinagens durante a pandemia, como convocar e participar de movimentos antidemocráticos sem máscaras, promover churrascos com apoiadores, etc. e tal. Não vem mais ao caso. Ponto importante é dizer que Jair nunca quis fazer nada contra a pandemia e isso era nítido. Sempre foi. Do seu ponto de vista, deveriam ser protegidos única e exclusivamente os
interesses econômicos da classe empresarial.

O presidente da nação nunca se preocupou com a pobreza, o desemprego e a ajuda financeira às classes mais necessitadas em tempos de pandemia.
Nunca pensou no pobre do trabalhador que coloca sua vida em risco, pega ônibus lotado e se aglomera para ir trabalhar. Nunca nem ligou para os que sufocavam nos corredores dos hospitais, para os parentes que amargavam saber notícias de seus entes queridos do lado de fora dos hospitais de campanha. Nunca nem ligou se o povo se aglomerava nas filas da Caixa Econômica Federal para receber míseros R$ 600, que não paga nem 10% do auxílio-moradia que recebia ou auxílio-paletó que paga aos militares. Nunca ligou sobre as consequências e repercussões que seus maus exemplos de conduta e desgoverno causariam na população. Nunca se preocupou com as consequências nefastas em indicar um medicamento que jamais teve sua eficácia cientificamente comprovada no tratamento contra a covid-19.

A preocupação de Bolsonaro é e sempre foi uma só: agradar a elite empresária que o apoiava e ganhar a reeleição que se aproxima. Pois é, a conta vem. A derrota de seu “BFF” Donald Trump já demonstrou isso. Agora, “Bolsomito” se cerca de desculpas como: que o STF não o deixou governar, sem dizer no que exatemente, ou que o Brasil já estava quebrado e ele não podia fazer nada. Jair Bolsonaro não tem pudores em esconder sua incompetência e despreparo, uma vez que, se não sabia das condições que
herdaria o país quando se candidatou, é porque os 30 anos como deputado federal não lhe ensinaram nada, nem ao menos o traquejo político que deve ter com seus aliados, a quem dispensa sem dó nem piedade, caso não atendam aos seus “reizinho mandou”. Governo de uma pessoa só. Autoritarismo crasso. Desgoverno, no mais puro sentido da palavra.

O mais triste é que seus eleitores e apoiadores precisaram de uma pandemia, precisaram que fossem infectadas quase 8 milhões e meio de pessoas, precisaram sacrificar quase 210 mil brasileiros e esperar o Brasil figurar como o terceiro país em número de casos e óbitos no mundo para se provar o óbvio: a incompetência, a arrogância, a teimosia, a burrice, o autoritarismo e o despreparo de Jair Bolsonaro para assumir a presidência de um país. Fato que já era evidente, aos que quisessem ver, desde a época das campanhas de 2018, quando não compareceu aos debates e só prestava entrevista a uma única emissora de TV, quando seu plano de governo não tinha nenhuma proposta sólida e concreta de saúde, educação, melhorias sociais, etc., quando ofendia negros, índios, mulheres, etc., quando tentava se desligar de sua ligação com as milícias armadas do Rio de Janeiro e as digitais do gabinete do ódio.

A vacina foi aprovada… a imunização é fato iminente. Agora, que venha a cura para a democracia brasileira!

Guilherme Dias Trindade
é advogado e reside em Santos-SP.

 

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