De olhar pelo outro lado

Lugar de Fala é o espaço dos leitores no site da Cult. Todo mês, artigos enviados por eles são publicados de acordo com um tema. O de fevereiro de 2021 é “sonho”.

Sêneca não ficou animado por ser exilado na Córsega, uma ilha montanhosa e acidentada a 100 km da costa da Itália, em 41 d.C. Estava a mais de 260 km de Roma. Era uma rocha no meio do oceano com uma única estrada pavimentada. Estava longe de seus amigos e familiares.

Quem lê a “consolação” que escreveu à mãe durante a sua estadia ali, pode ver que quem realmente consolava era ele mesmo. Porque ele estava infeliz neste lugar esquecido por Deus.

Então, um estudante de história desprevenido ao ler as descrições de Napoleão de sua bucólica infância e amada pátria… Córsega. Este era um lugar pelo qual ele estava disposto a lutar e morrer. Este é o lugar que ele queria ver pela última vez antes de ser exilado – o lugar que ele chorou ao pensar que nunca veria novamente.

É mais ou menos assim que as coisas acontecem, não é? É o que significa aquela expressão “o lixo de um homem é o tesouro de outro”. Mas, também, que o pesadelo de um homem é o sonho de outro. O que importa é como escolhemos ver as coisas, o que importa é a perspectiva que trazemos para as situações que enfrentamos. Sêneca poderia ter visto a mesma beleza de Napoleão, poderia ter abordado a Córsega com olhos mais infantis – mas, em vez disso, tudo o que pôde ver foi o que perdeu, tudo que pôde fazer foi comparar seu destino com sua vida em Roma. Ao fazer isso, ele se privou do que realmente estava ao seu redor e tornou sua sentença mais difícil.

A questão para você hoje é: de que maneira você está fazendo a mesma coisa consigo mesmo? Em relação a onde você mora, o emprego que você tem, a pessoa com quem você se casou, a punição que você está sofrendo? Como seus sonhos estão sendo construídos na sua realidade?

Lucas Casemiro Brizon, 23, é professor
de Filosofia em São José dos Campos, SP