Transformar o feminismo difuso em potência política

Transformar o feminismo difuso em potência política

Mulheres de mais de quarenta países planejam interromper suas atividades remuneradas e domésticas nesta quarta (8). Convocada por movimentos feministas difusos, a Greve Internacional de Mulheres – também denominada Paro Internacional de Mujeres (PIM) e International Women’s Strike (IWS) – se pretende uma resposta global às violências diárias a que são submetidas e à desvalorização do trabalho feminino em todas as esferas. “Se nossas vidas não importam, produzam sem nós”, é o mote do movimento.

A mobilização internacional acontece na esteira de paralisações recentes na Argentina e na Polônia. No dia 3 de outubro do ano passado, polonesas saíram às ruas contra um projeto de lei que previa a proibição irrestrita do aborto no país. Negando-se a trabalhar ou a estudar, obrigaram que escolas, lojas, escritórios e universidades fechassem suas portas. No dia 19 do mesmo mês, a cena se repetiu: em repúdio ao brutal assassinato da adolescente Lúcia Perez, de 16 anos, argentinas paralisaram suas atividades entre as 13h e as 14h daquele dia. O movimento, que se ampliou para toda a América Latina e ficou conhecido como Ni Una Menos, é uma das inspirações para a Greve Internacional convocada neste 8 de Março.

“Paramos para valorizar o trabalho invisível que fazemos, que constrói redes de apoio e estratégias vitais em contextos difíceis e de crise”, diz o texto de convocação brasileiro. No manifesto “Por uma greve internacional militante no dia 8 de Março”, Angela Davis, Nancy Fraser e outras feministas destacam a piora, nos últimos 30 anos, da condição de vida de mulheres de cor, trabalhadoras, desempregadas e migrantes graças à financeirização e à globalização empresarial.

No Brasil, há atos previstos em pelo menos doze capitais, e os protestos miram principalmente a reforma da previdência proposta pelo governo de Michel Temer – que quer fixar idade mínima para aposentadoria de homens e mulheres aos 65 anos.

À convite da CULT, seis militantes feministas falam sobre a importância de ressignificar o 8 de Março, transformando-o em um dia de luta, e não de flores.


FLÁVIA BIROLI, cientista política, historiadora e professora

Flávia Biroli (Divulgação)

 

 

 

 

 

 

Neste 8 de Março, a Greve Internacional de Mulheres mostra a força dos movimentos organizados e a transformação do feminismo difuso em potência política. Direitos sociais, trabalhistas e previdenciários estão ameaçados e as mulheres se organizam porque não aceitam a retirada de seus direitos. O capitalismo predatório e o fechamento da democracia comprometem suas vidas, o meio ambiente e também as vidas de seus filhos. Eu vou parar pelo direito das mulheres à aposentadoria e a condições justas de trabalho. Vou parar porque o Estado brasileiro criminaliza a decisão das mulheres de interromper uma gravidez indesejada enquanto retira o amparo de que precisam para ser mães com dignidade e segurança.


LUANA HANSEN, rapper, sonoplasta, DJ, MC e produtora musical

Luana Hansen (Foto: Divulgação)

 

 

 

 

 

 

Como mulher negra lésbica e militante, venho sentindo na pelo o descaso e o retrocesso. Vem se tornando cada vez mais difícil não lutar. Estamos perdendo espaços culturais, projetos que sempre fizemos sozinhas e que agora são sufocados pelo conservadorismo que mata, aliena e fere todos os dias. O dia 8 é para lembrar as lésbicas, mães solteiras, mulheres indígenas e negras que são invisibilizadas, arrastadas e mortas a cada cinco minutos. Vamos parar no dia 8 pela legalização do aborto e para lembrar a sociedade que exigimos respeito.


TEREZINHA VICENTE, jornalista e integrante da Rede Mulher e Mídia

Terezinha Vicente (Foto: Divulgação)

 

 

 

 

 

 

As mulheres sempre estiveram à frente das lutas por direitos humanos, igualdade política, por uma vida sem violência e em defesa do direito de cada um decidir sobre o próprio corpo. Conquistaram alguns avanços e os fundamentalistas e o patriarcado reagiram, tomando de assalto os poderes republicanos – vide o golpe no Brasil. Mas o feminismo tem rebeldia e coragem, os fascistas não passarão. Há muitos anos não se via repercutir tanto um chamado internacional das mulheres, como este 8M , que unifica sobretudo as Américas contra governos retrógrados instalados. Há um novo feminismo no mundo, e isto é só o começo.


NALU FARIA, coordenadora da SOF Sempreviva Organização Feminista 

 

Nalu Faria (Foto: Divulgação)

 

 

 

 

 

 

O 8 de Março continua expressando os desejos, sonhos e a vontade das feministas de construir uma sociedade profundamente igualitária.  É inegável a força do feminismo, sua visão profundamente crítica, propositiva e de visibilização da enorme contribuição das mulheres para a sustentabilidade da vida. No Brasil, mobilizaremos todo o país para fortalecer a luta por uma sociedade sem exploração de classe, sem racismo, sem opressão das mulheres, com respeito à diversidade sexual e em harmonia com a natureza. Nossa prioridade será a luta contra a reforma da previdência, pela descriminalização do aborto, por uma vida sem violência que garanta a autonomia das mulheres – bandeiras que devem estar articuladas com a luta contra o golpe e pela recuperação da democracia.


NANA SOARES, jornalista, co-autora da campanha contra abuso sexual do Metrô de São Paulo

 

Nana Soares (Foto: Divulgação)

 

 

 

 

 

 

O 8 de Março teve origem na luta das mulheres. Luta essa que nunca parou, mas que vem mais forte e necessária esse ano por conta dos retrocessos políticos e ataques aos nossos direitos no mundo inteiro. Se antes esses ataques eram implícitos, agora perderam a vergonha de mostrar a que vieram. É um dia do ano que renova nossa luta e relembra que só através dela conseguimos mudar alguma coisa. Da luta viemos, com luta venceremos.


LOLA ARONOVICH, professora de Literatura em Língua Inglesa da UFC e autora do blog Escreva Lola Escreva

 

Lola Aronovich (Foto: Divulgação)

 

 

 

 

 

 

O Dia Internacional da Mulher é fundamental para marcar a nossa luta feminista. Nos últimos anos o capitalismo vem tentando confiscar a data como um dia de presentear mulheres. Não é este o significado, e sim a resistência, a sororidade, a indignição com um mundo ainda muito machista e desigual. Este 8 de Março tem um valor mais especial em 2017, ano de intensos retrocessos. As reformas prometidas pelo governo golpista, que vão contra os interesses da imensa maioria dos brasileiros, vão impactar acima de tudo as mulheres, e por isso é importante a greve programada para a data. Como autora de um dos maiores blogs feministas do país, eu apoio a luta.

 

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